Deputado e prefeito do Paraná admitem desvio de função de assessor e fecham acordo com o MP
Após investigação do Gaeco, Gugu Bueno (PSD) e Marcel Micheletto (PL) reconhecem irregularidade e firmam acordo para evitar processo por improbidade administrativa. Caso reacende debate sobre uso da máquina pública e fiscalização de cargos em Curitiba e n

Em um dos episódios recentes que mais chamaram atenção na política paranaense, o deputado estadual Gugu Bueno (PSD) e o prefeito de Assis Chateaubriand, Marcel Micheletto (PL), admitiram ao Ministério Público do Paraná (MP-PR) o desvio de função de um assessor parlamentar. O caso, investigado pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), escancarou como o uso inadequado de cargos públicos ainda é um desafio relevante não apenas para o Paraná, mas em todo o Brasil. Os dois políticos fecharam um Acordo de Não Persecução Cível (ANPC) para evitar responder a processo por improbidade administrativa, comprometendo-se ao pagamento de multas e ressarcimento parcial aos cofres públicos. A situação reforça a importância da transparência e do controle social sobre a utilização da máquina pública, especialmente em tempos de desconfiança da população com seus representantes.
O caso: da investigação à admissão da irregularidade
A irregularidade foi identificada após minuciosa investigação do Gaeco, que apontou o desvio de função de um servidor vinculado à Assembleia Legislativa do Paraná (Alep). Segundo o MP-PR, entre julho de 2021 e abril de 2022, o assessor parlamentar que deveria desempenhar atividades diretamente ligadas ao mandato de Gugu Bueno acabou executando tarefas de interesse particular para Marcel Micheletto, que à época estava licenciado do cargo de deputado estadual para assumir a Secretaria da Administração do Governo do Estado. As diligências do Gaeco revelaram que, durante o período investigado, o funcionário realizou, em horário de expediente, serviços como transporte de familiares de Micheletto, entrega de envelopes em agências lotéricas e até pequenas compras, como pão para a casa do então secretário.
O documento oficial do Ministério Público registra que “com vontade livre e consciente, agiram com a finalidade de ganhar vantagem patrimonial indevida”, o que configura, em tese, ato de improbidade administrativa, previsto em lei federal. Apesar da gravidade dos fatos apurados, Gugu Bueno e Marcel Micheletto firmaram acordo com o MP-PR reconhecendo a irregularidade e evitando, ao menos por ora, o risco de perderem direitos políticos ou funções públicas.
O acordo de não persecução cível e seus efeitos práticos
Celebrado em outubro de 2024, o Acordo de Não Persecução Cível (ANPC) firmado entre os políticos e o Ministério Público prevê que ambos ficarão livres de responder à ação de improbidade administrativa, desde que cumpram determinadas condições. Marcel Micheletto comprometeu-se a devolver R$ 62.914,53, valor referente aos salários pagos ao servidor no período em que desempenhou funções particulares, além de pagar uma multa de R$ 15.728,63. Já o deputado Gugu Bueno se responsabilizou pelo pagamento de R$ 15 mil de multa, sem necessidade de ressarcimento direto ao erário.
Apesar da formalização dos acordos, que ainda aguardam homologação judicial, o caso reacende o debate sobre a efetividade desse tipo de instrumento jurídico e o risco de “perdão institucional” a práticas administrativas irregulares. No contexto nacional, os ANPCs têm se tornado mais comuns como ferramenta de resolução rápida de processos, especialmente em casos sem dano comprovado ao erário ou sem dolo intenso, mas seguem cercados de polêmica sobre sua real eficácia na prevenção de novos casos.
A resposta dos envolvidos e o posicionamento institucional
Em nota oficial, o deputado Gugu Bueno ressaltou que o Ministério Público reconheceu a “falta de gravidade dos fatos” e propôs o acordo como solução administrativa adequada. Segundo Bueno, parte da equipe do gabinete foi mantida após sua posse no lugar de Micheletto, e ele não teria ciência das atividades paralelas do servidor devido ao regime remoto adotado pela Alep na pandemia de Covid-19. Mesmo assim, afirmou não se eximir da responsabilidade administrativa.
Já a defesa de Marcel Micheletto reforçou que o acordo firmado tem natureza exclusivamente cível, afastando qualquer conotação penal, e que não houve prejuízo direto aos cofres públicos. Micheletto aceitou devolver integralmente os valores recebidos pelo servidor no período investigado, além de arcar com multa civil. Ambos os acordos dependem ainda de análise e aprovação final da Justiça para terem validade plena.
O impacto institucional e o contexto da improbidade administrativa no Paraná e no Brasil
O caso envolvendo Gugu Bueno e Marcel Micheletto reacende discussões históricas sobre o uso político dos cargos públicos e a fiscalização do emprego de servidores nas casas legislativas do Brasil. Segundo especialistas em administração pública, o desvio de função de assessores parlamentares é uma das faces mais comuns da má gestão do recurso público e da fragilidade dos controles internos, especialmente em tempos de transição política ou mudanças de gabinete.
No Paraná, não é o primeiro episódio que coloca sob suspeita a rotina dos gabinetes parlamentares e a relação entre deputados e seus colaboradores. Casos semelhantes já foram identificados em outros estados e até em nível federal, onde a disputa por cargos de confiança e o uso de funcionários em tarefas privadas desafiam constantemente as estruturas de compliance e integridade do setor público brasileiro. Em Curitiba, o tema ganhou destaque em debates recentes sobre reforma administrativa e corte de gastos na Assembleia Legislativa.
Desdobramentos: consequências práticas e próximas etapas
O Acordo de Não Persecução Cível, se homologado pela Justiça, encerrará o processo por improbidade administrativa contra os dois políticos, mas não elimina questionamentos sobre as lacunas nos mecanismos de fiscalização do serviço público. Para a sociedade, o episódio é um alerta sobre a necessidade de monitoramento constante das atividades dos gabinetes parlamentares e do uso dos recursos públicos, especialmente em momentos de crise institucional e descrença nas instituições.
O Ministério Público do Paraná, por sua vez, defende a utilização de instrumentos negociais como o ANPC para garantir ressarcimento rápido e efetivo ao erário, ao mesmo tempo em que desafoga o Judiciário de processos longos e, muitas vezes, de difícil tramitação. Por outro lado, entidades de controle social e especialistas pedem transparência e acompanhamento rigoroso dos casos para evitar a banalização do acordo e garantir a efetividade das punições em situações de irregularidades comprovadas.
Reflexão final
O caso envolvendo o deputado Gugu Bueno e o prefeito Marcel Micheletto é mais um capítulo no desafio permanente de consolidar uma cultura de responsabilidade e ética na gestão pública, tanto em Curitiba quanto no Brasil. Ao admitir e corrigir a irregularidade, os envolvidos respondem à pressão social por mais transparência, mas o episódio reforça que o controle da sociedade, da imprensa e dos órgãos fiscalizadores é fundamental para evitar desvios e fortalecer a confiança nas instituições democráticas. O desfecho do processo agora depende da análise do Judiciário, enquanto o debate sobre o papel dos acordos e a responsabilização dos agentes públicos deve continuar pautando o noticiário regional e nacional.
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