Desafios do diagnóstico travam luta do Brasil para eliminar a malária até 2035
Mesmo com avanços, Brasil ainda registra milhares de casos anuais de malária e especialistas alertam: vigilância e diagnóstico fora da Amazônia são essenciais para atingir meta de erradicação.

Uma doença antiga, que já foi erradicada em boa parte do mundo, ainda desafia o sistema de saúde brasileiro e expõe fragilidades na vigilância epidemiológica: a malária. No Dia Mundial da Malária, celebrado em 25 de abril, o Ministério da Saúde divulgou uma redução expressiva de 26,8% nos casos da doença entre janeiro e março de 2024, comparado ao mesmo período do ano anterior. No entanto, os números ainda impressionam: foram mais de 25 mil registros em apenas três meses. O dado revela não só a persistência da doença, mas também os desafios para atingir a meta nacional de eliminar a transmissão até 2035 – tarefa que, segundo especialistas, depende do fortalecimento do diagnóstico e de uma mobilização além da região amazônica.
O desafio do diagnóstico: um obstáculo nacional
Embora 99% dos casos de malária no Brasil estejam concentrados na Amazônia, o mosquito transmissor, o Anopheles, está presente em 80% do território nacional. “A malária não é apenas um problema amazônico”, alerta o imunologista Claudio Tadeu Daniel-Ribeiro, chefe do Laboratório de Pesquisa em Malária da Fiocruz e membro do comitê de assessoramento do governo federal. O especialista destaca que a circulação de pessoas entre regiões, seja do Brasil ou vindas de áreas endêmicas como a África, amplia o risco de reintrodução da doença em zonas antes consideradas livres, como o Sul do país.
A dificuldade de diagnóstico adequado é, segundo Daniel-Ribeiro, um dos maiores entraves para a erradicação. Fora da Amazônia, médicos e profissionais de saúde nem sempre desconfiam de malária diante de sintomas como febre, dor de cabeça, calafrios e sudorese – manifestações que se confundem com outras doenças infecciosas comuns. O atraso no reconhecimento compromete o tratamento precoce e favorece a propagação do protozoário, podendo levar a surtos em locais onde a doença já estava controlada.
Malária fora da Amazônia: risco real para o Paraná e Curitiba
Apesar de o Paraná não figurar entre os estados com maior incidência, casos importados são registrados anualmente. A Secretaria de Estado da Saúde do Paraná alerta que turistas e trabalhadores que viajam para regiões amazônicas ou outros países endêmicos devem redobrar os cuidados. O aeroporto internacional Afonso Pena, em São José dos Pinhais, é uma das principais portas de entrada de viajantes vindos do Norte do Brasil e de países como a Guiana Francesa, onde a malária é endêmica.
O Instituto de Saúde Pública do Paraná reforça a importância da rede de vigilância: qualquer pessoa que apresente sintomas após viagem a áreas de risco deve procurar atendimento imediato e informar sobre o deslocamento. “O diagnóstico precoce é fundamental não apenas para o paciente, mas para evitar que a doença volte a circular em nosso território”, destaca a infectologista Carla Muraro, referência no combate a doenças tropicais em Curitiba.
Diagnóstico rápido e tratamento eficaz: avanços e limitações
Hoje, o Brasil conta com testes rápidos capazes de identificar a infecção por malária com apenas uma gota de sangue, disponíveis em unidades do SUS. O tratamento é considerado seguro e eficaz quando iniciado precocemente, interrompendo a transmissão e reduzindo o risco de complicações graves. Contudo, a falta de capacitação dos profissionais de saúde em regiões não endêmicas ainda limita a detecção oportuna.
Além disso, quase todos os casos registrados no país são causados pelos protozoários Plasmodium vivax (80%) e Plasmodium falciparum (20%). O vivax tem maior capacidade de infectar, enquanto o falciparum representa maior risco de morte, especialmente quando não tratado a tempo. Até 2030, o Ministério da Saúde pretende eliminar os casos de P. falciparum, considerada a forma mais letal da doença.
Mudanças climáticas: um novo desafio para a saúde pública
O aquecimento global adiciona uma camada de complexidade à luta contra a malária. Estudos indicam que tanto o mosquito Anopheles quanto o próprio Plasmodium são sensíveis ao clima, favorecendo a expansão da doença para áreas antes consideradas de baixo risco. Claudio Tadeu Daniel-Ribeiro explica que, se as temperaturas médias continuarem subindo, existe o risco de reimplantação da malária em regiões do Sul e Sudeste do Brasil, inclusive no Paraná.
A Fiocruz alerta que as alterações ambientais também dificultam o controle do vetor, já que chuvas intensas, aumento de áreas alagadas e variações de temperatura podem criar novas condições para a proliferação do mosquito. Para cidades como Curitiba, a intensificação das ações preventivas se faz ainda mais urgente diante desse cenário.
Esforços e perspectivas: o que falta para eliminar a malária no Brasil
O Brasil avançou significativamente no controle da malária nas últimas décadas, mas especialistas apontam que é preciso ir além das fronteiras amazônicas para alcançar a erradicação. Investimentos em diagnóstico, vigilância ativa, capacitação de profissionais e campanhas de conscientização são considerados cruciais, especialmente em grandes cidades e corredores de mobilidade, como Curitiba.
Além disso, o envolvimento da sociedade é indispensável. Proteger-se contra picadas de mosquito, buscar atendimento rápido em caso de sintomas e informar sobre viagens a áreas de risco são atitudes que contribuem para o bloqueio da transmissão. O compromisso do governo em atingir as metas de 2030 e 2035 depende, em grande parte, da participação ativa da população e do engajamento das redes de saúde estaduais e municipais.
Conclusão
Eliminar a malária do Brasil é um desafio coletivo que requer vigilância permanente, investimento em tecnologia e educação em saúde. No Paraná, em Curitiba e em todo o país, fortalecer a detecção rápida e ampliar a conscientização pode ser a chave para atingir a tão almejada meta de erradicação. Enquanto isso, cada novo caso serve de alerta: a luta contra a malária ainda não terminou, e exige atenção contínua de toda a sociedade.
COMENTÁRIOS